sexta-feira, 25 de setembro de 2015

VIVER E REVIVER - RITA CORURIPE

Voz de Ricardo Moresi

* Reprodução neste blog gentilmente autorizada pela autora

Observo as mãos enrugadas, dedos longos e magros seguram uma xícara de café fumegante.
No rosto envelhecido, o olhar cansado, os vincos na pele indicam que muita bagagem acumulada ocupa aquele ser tão interessante.

Os gestos lentos e os cabelos prateados são para mim um convite, que vontade de me aproximar, sinto uma necessidade gritante de conversar com aquela senhora, mas receio não ser bem recebida, geralmente as pessoas mais velhas são desconfiadas e arredias.

Embora eu já tenha terminado o meu lanche, decido ficar mais um pouco observando aquele "livro vivo", quem sabe até tomo coragem de ir até lá cumprimenta-la. O nome dela é Guilhermina, a garçonete pergunta algo, que fica sem resposta.

D. Guilhermina está praticamente imóvel, sentada próximo a uma grande vitrine, ela tem o olhar fixo em algum ponto, que eu, do lugar onde estou não consigo identificar. O que será que ela está pensando, ou em quem?

Levanto e caminho em direção a ela, chego devagar para não assusta-la, a distração é tanta, que ela sequer percebe que eu me aproximei. A chamo pelo nome, ela então me olha, pergunto se posso fazê-la companhia, ela consente em silencio, com um sutil menear de cabeça.

Após sentar a sua frente, eu me apresento e confesso que estou há quase uma hora a observando, e que estou curiosa para saber a razão da sua divagação, pergunto em que ou em quem ela está pensando.

D. Guilhermina sorri, olha em meus olhos e após um breve silencio me responde: - Minha filha, quando cheguei a certa idade, parei de pensar, vi que era perda de tempo, decidi então começar a resgatar em minhas frágeis memórias, tudo o que eu já havia vivido até hoje.

Comecei a reviver a minha vida, dia após dia, a medida que eu conseguia tirar do baú de minhas experiências, os fatos que me trouxeram aqui, que me fizeram amadurecer, percebi que me sentia viva, rejuvenescida, era como se eu estivesse vivendo tudo novamente, desta vez em um lugar mais confortável, como se estivesse em uma plateia.

Sinto-me renovada e viva lembrando quem fui, e me sentindo viva eu não penso na morte, desta forma, quando a morte um dia chegar para me levar, eu irei feliz, pois vivi intensamente e em dobro, tudo que me permiti.


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